Esse é o modelo de roteiro mais usado por aí, tanto em livros quanto em filmes. E é tão simples quanto o nome sugere: uma história dividida em três partes.
Essa simplicidade faz dele o ideal para quem tá começando a se descobrir na escrita. Agora não pense que, por isso, a estrutura de três atos seja somente para amadores.
Um modelo de roteiro, qualquer que seja, é só uma forma de organizar as ideias que você já teve, te forçando a pensar em alguns pontos críticos para que a história funcione. E se ela funcionar, não há amadorismo. Na verdade, esse modelo é usado por blockbusters e best-sellers em todo o mundo.
Até porque, no fim, é só isso o que queremos: uma história que funcione.
As Três Partes
Há quem as chame simplesmente de “início, meio e fim”, mas eu prefiro “preparação, confronto e resolução.”
Em termos de tamanho, estima-se:
Preparação — 25%
Confronto — 50%
Resolução — 25%
Os números são bons para se ter uma ideia, mas não precisa se apegar a eles.
Mais importante é ter em mente que essas três unidades devem funcionar de maneira independente. Isso significa que cada ato também precisa ser pensado com um início, um meio e um fim.
O que marca o fim de um ato e o início de outro são os Pontos de Enredo (do inglês, Plot Point), quando todo o desenvolvimento do ato é resumido por uma escolha do protagonista.
Uma história nada mais é do que uma série de escolhas e consequências, mas nos Pontos de Enredo devem aparecer as escolhas mais importantes (ao menos, antes da decisão final).
Então, por ora, o que temos é:
- Sequência de eventos que perturbam o mundo do protagonista, resumida ao fim por uma escolha.
- Sequência de confrontos progressivos, resumida ao fim por outra escolha.
- Sequência de eventos que levam ao clímax. E então, é bom resumir a trama inteira com uma escolha final, mas logo falo mais sobre isso.
Esclarecimento: Os 7 Pontos Críticos
Embora os pontos ilustrados na figura ali em cima acompanhem a Estrutura de Três Atos, eles podem ser usados à parte. Tanto que existe algo chamado de “Estrutura dos Sete Pontos”, que ignora os atos e usa os pontos na ordem em que aparecem para checar se a história está nos trilhos.
E é por esse motivo que você vai ver exemplos aqui que não seguem os três atos, mas ilustram muito bem um ponto ou outro.
Ato 1: Preparação
Aqui o “estado padrão das coisas” é apresentado, então um evento inesperado acontece e o protagonista, passando ou não por uma etapa de aceitação, reage.
Apresentação
O estado padrão das coisas é definido respondendo perguntas como:
- Quem é o protagonista?
- Como é o ambiente? Em termos físicos, sociais, econômicos…
- Quem são as pessoas que cercam o protagonista? Amigos? Familiares? Rivais?
- O que ele costuma fazer? Por que ele faz o que faz?
- O que ele pensa a respeito? Está feliz? Realizado? Angustiado?
Agora cuidado. É muito fácil cair em um problema de exposição no início de uma história, afinal, é muita informação para manejar partindo do zero… E o início é crucial.
Se escritores desconhecidos como eu e você não fisgarmos o leitor cedo, ele vai pôr o nosso livro de lado e nunca mais vai nos dar uma chance.
Por isso eu vou me prolongar um pouco nesse ato. Primeiro, fique atento a essas observações:
Eu entendo, o leitor ainda não sabe quais são suas inúmeras ideias maneiras e você quer transmiti-las rápido para que ele fique tão empolgado quanto você.
Mas dá uma olhada em um livro hipotético que começa assim:
Meu nome é Júlia, tenho 16 anos e cresci em Nasle. Esse é um planeta do terceiro quadrante de Guar-342, que fica a uns doze mil anos-luz do nosso setor de origem, o do Sistema Solar. Meus pais morreram em uma implosão glacial quando eu tinha cinco anos, então fui criada pela minha avó, dona Margarete. Ela é uma veterana da Guerra Interdimensional de Vocrax e, apesar de ter se destacado como fuzileira espacial, hoje em dia tudo o que faz é reclamar da coluna e pegar no meu pé. A Guerra Interdimensional de Vocrax foi aquele conflito que aconteceu entre a Federação Troliete e a União de Guadalar, quando o Almirante Dal Cruz dos trolietes decidiu anexar a lua de Vocrax à Federação, mantendo como refém o sobrinho de Polimaro, líder da União…
Enfim, acho que você já entendeu. Nesse ritmo, quando o leitor terminar a primeira página, a maioria dos detalhes vão ser esquecidos e ele só vai ficar com algumas informações vagas na cabeça.
Ele ainda não sabe onde a cena começa, se é que já começou, muito menos para onde ela pode ir e, portanto, não tem nenhuma expectativa imediata. E se você não criar uma expectativa imediata rápido, vai apostar demais na motivação inicial do leitor; o que para a maioria significa que aquela será a única página lida.
Com expectativa imediata quero dizer algo tão simples como duas pessoas caminhando por um corredor. A expectativa mínima que você cria aqui é algo como “para onde essas pessoas estão indo?”.
Além disso, escolha com cuidado o que apresentar e sempre dê um contexto. Ao invés de puxar o assunto da Guerra Interdimensional do nada, por exemplo, a Júlia podia estar visitando um museu sobre a Guerra.
O Thiago fala muito bem sobre isso nos nossos artigos sobre exposição:
Toda. Não há exceção.
Tô sendo enfático aqui para você não cair naquele pensamento de “ah, todo começo de livro é meio parado e o leitor já espera por isso mesmo…”
Se você quiser manter a tensão baixa no início, tudo bem, mas isso não significa que o ritmo deva ser constante. O interesse do leitor depende das oscilações, depende de um ou outro parágrafo conseguir se destacar entre os outros, entende?
E o ponto de virada é esse destaque. É quando uma nova informação causa surpresa no leitor. Há inúmeras maneiras de se trabalhar com isso, e eu sei que tô devendo um artigo com esse tema… prometo que ele não demora.
Por ora, pense que aquilo que é surpreendente para o leitor não precisa ser surpreendente para as personagens. E isso é ainda mais verdade no início da história, quando o leitor não conhece nada nem ninguém. Então use isso ao seu favor.
Pode ser que lá na terceira cena, você decida revelar que o protagonista tenha uma doença degenerativa e que só lhe restam mais três semanas de vida… Mas isso o protagonista já sabia e, inclusive, justifica ações estranhas que ele tomou nas cenas anteriores.
Vê? Com um truque simples, você já criaria logo na largada um daqueles momentos “a-ha!”.
Quase sempre o estado padrão das coisas está relacionado com a rotina do protagonista. E apresentar uma rotina é delicado.
Acordar, tomar banho, comer, ir pra escola/trabalho… Se essas atividades não tiverem nada de incomum, isso é um tiro no pé. Mesmo que você use isso para apresentar outras personagens, se o diálogo for banal, é outro tiro no pé. E mesmo se um detalhe ou outro for incomum, ainda assim, é perigoso.
Então inverta o foco: faça do incomum o principal da cena e deixe o que é banal nos detalhes. Embora a maioria das coisas banais você não precise nem mesmo citar.
A bem da verdade, essa três observações valem para todo o resto da história, mas é especialmente importante você se ater a elas no início, beleza?
Como a primeira ideia que temos dificilmente é a melhor, um bom exercício é planejar pelo menos uns três inícios diferentes. E eu não tô falando aqui de todo o ato, mas só das primeiras cenas.
E aí, com o estado padrão das coisas apresentado, chegamos ao primeiro ponto crítico…
Gancho (Hook ou Inciting Incident)
Esse é o distúrbio que vai fazer toda a história acontecer. E um bom distúrbio precisa forçar o protagonista a abrir mão do “estado padrão das coisas” para ir buscar algo novo. Isso pode acontecer de duas maneiras:
1. O protagonista está satisfeito com o que tem: O gancho faz ele perder algo de valor ou prevê uma perda futura.
Os pais de Kvothe e toda a trupe dos Edema Ruh são assassinados pelo Chandriano. É o clássico “perdi tudo e quero vingança”.
Mas essa perda não precisa ser externa. O protagonista pode ter sua honra como um valor importante e algo que a ameace já é o suficiente.
É claro que um roteiro com vários protagonistas acaba disparando vários ganchos. Mas olhando para história como um todo, o gancho raiz é o convite que Robert faz a Ned para ele se tornar a Mão do Rei. E esse não é o tipo de convite que se pode recusar.
2. O protagonista está insatisfeito com o que tem: O gancho é uma oportunidade de mudar de vida.
Como exemplo temos a fada madrinha aparecendo ou a icônica carta de Hogwarts chegando pelo correio.
Só que essa oportunidade de mudar de vida pode aparecer de forma indireta, como em um evento que altera a forma de pensar do protagonista.
O encontro de Montag com Clarisse MacClellan, logo na primeira cena, é recheado de perguntas inocentes que vão ao mesmo tempo apresentando o mundo distópico e colocando perguntas na mente de Montag que ele nunca tinha feito. E o diálogo culmina em um gancho sutil:
“ — Boa-noite! — [ela] foi para casa, mas pareceu lembrar-se de algo e voltou-se, olhando para ele com admiração e curiosidade. — Você é feliz? — perguntou.
— Eu sou o quê? — gritou ele.
Mas ela se fora, correndo sob o luar. A porta da casa fechou-se suavemente.
— Feliz! Mas que absurdo!
Montag parou de rir.”
Pode ser também que o protagonista tenha uma ambição grande e, enquanto não alcançá-la, não vai se sentir satisfeito; o que não significa que ele tenha uma vida infeliz.
Clarice quer fazer seu nome no FBI e informações para solucionar o caso de Buffalo Bill irão ajudá-la nisso. É à procura delas que Clarice é enviada para interrogar Hannibal Lecter.
E às vezes, independente da satisfação inicial, o gancho promove tanto uma perda quanto uma oportunidade. O próprio exemplo de A Guerra dos Tronos se encaixa aqui, mas só pra forncer mais um:
Morgana é levada a Avalon. Ela é forçada a deixar a família para trás (perda) e se tornar uma sacerdotisa (oportunidade).
Comprometimento
O gancho pode ou não resultar em um comprometimento do protagonista. Se resultar, o roteiro já vai direto para o Ponto de Enredo 1.
Mas boa parte das vezes, o protagonista fica em choque, nega ou ignora o distúrbio. Então é preciso de um tempo para digerir o que aconteceu.
Em outros casos, por mais que o protagonista queira se comprometer, não sabe o que fazer. E aí, precisa de um tempo para descobrir ou para uma ajudinha aparecer.
O objetivo aqui é preparar o terreno para se ter um bom Ponto de Enredo. Isso pode vir com uma conversa, uma reflexão interna ou uma força maior que agrava o gancho.
As corujas vão chegando, as cartas vão acumulando, os Dursley viajam com Harry para longe de casa… e no fim, Hagrid aparece.
Mildred, a esposa de Montag, tem uma overdose de tranquilizantes e, depois de salva, não quer discutir o assunto. Montag percebe não só a distância que existe entre eles, mas que não sabe nada sobre a esposa, nem mesmo lembra como se conheceram. Então ele se dá conta de que a única coisa que ama é queimar livros. A infelicidade se instala e o gancho é absorvido.
Ponto de Enredo 1 (Plot Point)
O protagonista decide tomar a dianteira e fazer algo a respeito. E essa escolha é o que impulsiona todo o segundo ato.
É claro que quando falo em escolha, não me refiro a uma escolha passiva, no campo das ideias… Ela precisa vir acompanhada de uma ação. E é a consequência imediata dessa ação que fecha o primeiro ato.
Um bom primeiro Ponto de Enredo tem essas três características:
I. Parte genuinamente do protagonista.
II. Coloca-o de vez na jornada sem chance de retorno.
III. Renova sua determinação em atingir seus objetivos.
A ação mais simbólica é a travessia da plataforma 9 3/4. Harry vê os outros passando e, ainda um tanto inseguro, corre em direção à parede… então embarca de vez para Hogwarts.
Em uma de suas rondas, Montag rouba um livro ao invés de queimá-lo. Isso marca a sua desconfiança no sistema e a percepção de que é impossível ser feliz seguindo as regras do jogo.
Clarice resolve o código de Lecter e chega em um depósito, onde encontra a cabeça de uma das vítimas de Buffalo Bill. Ela passa a acreditar que é capaz de resolver o caso.
Ato 2: Confronto
Apesar de ser o maior dos atos, ele pode ser resumido em duas palavras: conflitos progressivos.
Isso significa que o conflito que vier depois precisa ser mais complicado, mais arriscado ou mais significativo do que o anterior.
Falei bastante sobre isso nesse artigo aqui:
7 Dicas para turbinar os conflitos de sua história
Mas como esse é um ato longo, ficar empilhando um conflito em outro pode fazer o roteiro dar voltas sem progresso ou cair em um beco sem saída.
E é justamente para te ajudar a gerenciar essa sequência que aparecem os próximos pontos críticos…
Pinça 1 (Pinch Point)
As pinças são uma mudança súbita na gravidade dos conflitos, são momentos de reorientar o roteiro e renovar o interesse do leitor.
Até então, o segundo ato apresenta um protagonista que ainda está descobrindo a região fora da sua zona de conforto. E ele costuma reagir ao que acontece sem muita consciência do que é realmente importante fazer para chegar no seu objetivo.
Aí acontece um evento, a Pinça 1, que além de agravar a situação, entrega pistas que apontam o caminho certo.
Muitas vezes, esse evento também serve como um lembrete do poder do antagonista.
“Trasgo nas masmorras!” Esse é o conflito mais perigoso até então, e é a primeira prova de que há um antagonista por perto, quem quer que tenha deixado o Trasgo entrar.
Harry também nota a perna machucada de Snape e deduz que ele causou a confusão para tentar passar pelo cão de três cabeças. Mesmo que se prove errado, isso motiva Harry a descobrir o que está acontecendo.
Montag finge estar doente e falta o trabalho, mas seu chefe, Beatty, lhe faz uma visita. Sua suspeita de que Montag roubou um livro é evidente, mas ao invés de ameaçar, Beatty diz que é comum um bombeiro sentir curiosidade pelos livros e reforça os motivos dos livros destruírem a sociedade.
A conversa serve para dar mais peso às regras do sistema, o verdadeiro antoganista, e despertar em Montag o desejo por uma sociedade diferente.
Essa é a reorientação: antes Montag só escondia uns livros em casa, agora ele vai em busca de alguém que possa ajudá-lo a mudar as regras.
Clarice encontra um casulo na garganta de uma das vítimas, o que serve ao mesmo tempo como pista para o caminho certo quanto caracteriza o antagonista. A sequência pós-descoberta conta ainda com uma cena sob o ponto de vista de Buffalo Bill, quando a próxima vítima é raptada.
Ponto Central (Mid Point)
A partir da Pinça 1 as coisas vão se acertando. O protagonista supera um desafio atrás de outro, ganha confiança e parece que nada mais vai pará-lo.
Então… boom! Chega o Ponto Central, a maior disrupção depois do distúrbio no primeiro ato. Há inclusive quem o considere um segundo gancho. Em termos de impacto até pode ser, mas suas características são bem diferentes.
O Ponto Central:
- Apresenta uma falha, de preferência provinda de uma ação do protagonista.
- Ameaça o objetivo principal e instala dúvidas sobre o caminho seguido desde a Pinça 1.
- Deixa evidente as novas responsabilidades do protagonista.
Apesar de lá no Ponto de Enredo 1 o protagonista aceitar a jornada, ele só descobre o seu papel na Pinça 1. E agora no Ponto Central é quando ele tem consciência do que esse papel significa e aceita as responsabilidades.
É isso que você deve martelar aqui: o protagonista aceita sua nova identidade, com todos os prós e contras.
Com a ajuda de Hermione, Harry tenta libertar o dragão ilegal de Hagrid, mas é pego pelo Finch e levado para detenção.
Montag recita um poema para um casal amigo de Mildred e espera que eles fiquem motivados a debater o tema. Porém isso não acontece e Montag brada ofensas ao casal, fazendo escárnio de suas vidas vazias e corrompidas. Eles vão embora, o homem, furioso, e a mulher, em lágrimas, e Mildred se tranca no banheiro, tomando várias pílulas de tranquilizante.
A cabeça que tinha sido encontrada no depósito não era de uma vítima de Buffalo Bill. Clarice sente que foi usada e é forçada a interrogar Lecter de novo. Dessa vez, ele concorda em falar só com uma troca: uma informação de Bill por uma informação pessoal de Clarice. Marcando o auge de sua fé no FBI, ela aceita.
Pinça 2
Assim como a primeira Pinça, essa eleva a gravidade dos conflitos e reorienta o roteiro. Mas aqui isso acontece lembrando o protagonista dos riscos em jogo.
O importante é fazê-lo questionar o quanto está disposto a pagar para alcançar o objetivo final. E isso é feito com algum tipo de perda.
Como consequência, a história se encaminha para o seu momento mais baixo. É aqui que geralmente aparece o “Tudo Está Perdido” (falo sobre isso na seção de temperos para um roteiro inesquecível).
Na Floresta Proibida, Harry encontra Voldemort bebendo o sangue de um unicórnio e é atacado, mas se salva com a ajuda de um centauro. Aqui ele descobre que Voldemort é quem está interessado na Pedra Filosofal e que Hagrid, bêbado, entregou a informação para roubá-la.
Montag vai peitar Beatty no corpo do bombeiros, ajudado pelo Professor Faber, que lhe aconselha o que fazer através de um ponto eletrônico. Mas chegando lá, Montag é colocado contra a parede. Antes que cedesse e admitisse o roubo e a leitura de livros, o alarme soa e os bombeiros se preparam para o trabalho. O alvo é a sua casa.
Lecter é transferido para Memphis e Clarice é enviada junto. Ela vai até o apartamento da filha do senador para tentar encontrar algo, mas a esposa chega e a acusa de roubo. Clarice, então, deve largar o caso se não quiser ter a carreira arruinada. Mas ela faz ainda uma última visita a Lecter, que termina momentos antes dele escapar.
Ponto de Enredo 2
O protagonista descobriu, avançou, apanhou, amadureceu… e apanhou mais. Depois de chegar no fundo poço, ele precisa fazer uma escolha que sintetiza o que aprendeu ou que deixou de aprender.
Lembrando que essa escolha vem acompanhada de uma ação e a consequência dessa ação é o que fecha o segundo ato.
Um bom Ponto de Enredo 2 tem essas três características:
I. Parte genuinamente do protagonista.
II. Resume sua nova identidade. O ideal é que a escolha seja uma que o seu velho “eu”, anterior ao gancho, jamais teria feito.
III. Resulta em uma pequena vitória, algo simbólico que marca o retorno ao jogo, mas deixa claro que ainda há muito o que fazer.
Harry passa pelo cão de três cabeças e segue para apanhar a Pedra Filosofal antes de Voldemort.
Montag, traumatizado por ter sido descoberto e ser obrigado a atear fogo na própria casa, cede às provocações de Beatty e vira a mangueira na sua direção (ela jorra fogo ao invés de água). Isso é feito na frente de todos e, não tendo mais o que esconder, Montag inicia sua fuga.
De volta a Ohio, Clarice se dá conta que Buffalo Bill conhecia a primeira vítima antes de raptá-la. A essa altura, a fé de Clarice no FBI é baixa e, correndo o risco de ser demitida, continua a investigação por conta própria.
Ato 3: Resolução
Os conflitos agora acontecem sem pausa até culminarem no clímax. Em seguida, a tensão vai caindo conforme as últimas pontas se amarram.
Como se trata só de desenrolar o que já foi construído, é aconselhável que não seja introduzido nenhum conceito e nenhum personagem novo.
Aumento dos Riscos
A principal mudança entre os eventos do segundo ato e os do início do terceiro é o ritmo da narrativa. Até então, o protagonista tinha espaço para se recompor antes de partir para o próximo desafio, mas agora não tem mais. É uma sequência de eventos onde um conflito dispara outro pior, sempre elevando a tensão e aproximando o clímax.
Harry, Rony e Hermione passam por uma sucessão de desafios: visgo do diabo, chaves voadoras, xadrez de bruxo e as sete poções. No fim, Harry, sozinho, chega à última sala.
A polícia organiza um mutirão para caçar Montag. Ele enfrenta os cães de caça mecânicos, esconde livros na casa de um colega bombeiro e se vê obrigado a atravessar uma autoestrada (os carros correm a velocidades altíssimas e atropelar pedestres é um esporte comum).
Por um lado temos Clarice seguindo pista atrás de pista; por outro, temos o FBI descobrindo a identidade de Buffallo Bill e possíveis localizações; e ainda temos a filha do Senador tentando escapar: ela faz a cadela de Bill cair no mesmo poço onde estava e a usa como refém, pedindo para usar o telefone. Mas ao invés do telefone, Bill sobe para pegar uma arma e…
Clímax
O ápice da tensão. A última barreira até o o grande objetivo ser atingido e, por isso, todas as fichas são colocadas na mesa.
O Clímax pode apresentar uma ou mais das seguintes abordagens:
- Confronto direto contra o antagonista.
- Confronto contra a maior fraqueza. Você provavelmente já explorou isso em algum conflito anterior, e aqui é a chance do protagonista mostrar sua superação.
- Escolha difícil. Pra funcionar, essa escolha tem que fazer o leitor se contorcer, ele precisa sentir o dilema antes mesmo de saber a reação do protagonista.
- Revelação que muda por completo a visão do leitor sobre a história. Essa é difícil de implementar, geralmente aparece quando o roteiro já é todo montado para esse momento. Sexto Sentido e Clube da Luta, estou falando de vocês.
Harry descobre que Quirrell é quem está servindo Voldemort e, depois de conseguir a Pedra Filosofal através do espelho de Ojesed, o confronta.
Um novo e melhorado cão de caça mecânico é levado até a área. Montag se veste com as roupas de Faber, também pede para ele incinerar tudo o que foi tocado, esfregar o resto com álcool e ligar os regadores no jardim. Isso confunde o faro do cão de caça e ajuda Montag na corrida até o rio que cerca a cidade. A travessia não marca só sua fuga da lei, mas de tudo o que a sociedade representa.
Clarice bate na porta da Sra. Lippman, uma conhecida da primeira vítima de Bill. Quem atende é o próprio, o que Clarice descobre assim que enxerga uma mariposa na casa. Bill percebe que foi descoberto, os dois se enfrentam e Clarice consegue matá-lo.
Desfecho
O protagonista alcança ou ressignifica o seu objetivo. A tensão diminui e, se houver ainda conflito, não é mais tão desafiador quanto o clímax. Por fim, é apresentando ou subentendido um novo “estado padrão das coisas”.
O mais importante é cumprir toda promessa em aberto. Mesmo que seja o primeiro livro de uma trilogia, você precisa cumprir promessas importantes.
Nesse caso de séries, aproveite essa etapa de planejamento para definir quais promessas vão ficar pro próximo volume e quais vão ser resolvidas; então quando for escrever, enfatize as que vão ser fechadas agora. Falei mais sobre isso no artigo sobre cliffhanger.
Harry acorda na ala hospitalar. Dumbledore explica o que aconteceu e diz que a Pedra foi destruída. Por fim, a Grifinória ganha a Taça das Casas.
A polícia não pode admitir que perdeu o rastro e assassina um inocente em frente às câmeras. Longe dali, Montag encontra um grupo de foragidos, que vivem afastados das cidades, memorizando a maior quantidade de livros na esperança de um dia poderem republicá-los.
A filha do senador é resgatada com vida e Clarice faz seu nome. A última cena é de Lecter desfrutando da vida em um hotel e escrevendo cartas. Uma delas é para Clarice.
Temperos para um roteiro inesquecível
O Ponto Sem Retorno
Como já disse, o comprometimento com o gancho é um passo sem volta. Mas além do gancho é bom o roteiro apresentar um outro momento desses, mais marcante e dramático.
É comum usar o Ponto Central ou o Ponto de Enredo 2 como um Ponto Sem Retorno. Mas para entender melhor como essa escolha é feita, aconselho dar uma olhada no artigo que dediquei ao tema clicando aqui.
O Momento do “Tudo Está Perdido”
Como o nome sugere, esse é o momento mais depressivo da história. O protagonista não acredita mais que consegue ser bem-sucedido e pode até desistir da jornada. É um clamor desesperado por ajuda.
Embora não seja um Ponto Crítico, o “Tudo Está Perdido” amplia o constraste da história. E quanto maior o contraste, maior a sensação de progresso. Isso conquista leitores e não deve ser menosprezado.
Pois então, os Pontos Críticos trabalham com o vai e vem entre esperança e desespero. Só que uma boa história não trata só de altos e baixos, mas do quão fundo se vai em cada direção.
Pense nos dois momentos extremos: o mais perto que o protagonista fica do objetivo final e o mais longe. Se achar que deve reforçar o contraste, acrescente um “Tudo Está Perdido”.
Ele vem, claro, após uma falha. Como eu disse, é comum que venha após a Pinça 2.
A Escolha Final
Assim como o Ponto de Enredo 2 contrasta quem o protagonista era no início da jornada com quem ele se tornou, é legal colocar mais uma escolha no fim do terceiro ato para enfatizar essa diferença (e eventualmente agregar alguma mudança mais que possa ter ocorrido após o Ponto de Enredo 2).
Essa escolha pode vir tanto durante o clímax, o que cairia na abordagem que chamei de “escolha difícil”, quanto durante o desfecho.
Últimas Palavras
Só lembrando que nada do que está escrito aqui é uma lei intransponível. Esse modelo não deve enquadrar a sua ideia, pelo contrário, deve expandi-la. Use-o para perceber potenciais melhorias: talvez um Ponto de Enredo mais enfático ou uma Pinça para agitar as coisas naquele capítulo…
Além disso, caso esteja se descobrindo na escrita e se sentir limitado por todo essa planejamento, pode ser que essa não seja a sua maneira de escrever. Algumas escritores funcionam melhor sem planejamento, e o próprio Stephen King levanta essa bandeira. Para saber mais, veja Esqueça o outline e só comece.
E aí, pronto para escrever?